quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Por que Trolebus? - Adriano Murgel Branco

Adriano Murgel Branco
Por que Trolebus?
Durante muitos anos foi difícil sustentar a importância dos veículos elétricos no transporte público. Argumentava-se que veículos elétricos são mais caros, necessitam de rede elétrica, etc. etc. A primeira vitima dessa discriminação foram os bondes. No Brasil, havia 70 cidades com bondes; tudo foi jogado fora na década de 60. Nos Estados Unidos, a General Motors patrocinou a retirada dos bondes no país inteiro, tendo sido processada por isso. (Taken For a Rider (GM) - GNT Especial 21/05/1998).
Na sequência, foram-se os tróleibus. Das onze cidades brasileiras que operavam com essa tecnologia, só São Paulo sobrou. E só o conseguiu graças à persistência de alguns que, dentre outras ações, fabricaram nas oficinas da CMTC cerca de 200 veículos (meados dos anos 60) e, na Gestão Olavo Setubal, modernizaram o sistema e encomendaram 300 tróleibus em 1979, para dar início a um grande projeto de corredores (precursores dos BRT’s de hoje), infelizmente descontinuados.
Argumentos a favor dos tróleibus, como veículos não poluentes, com baixo nível de ruído, desempenho e conforto maiores, não foram suficientes para assegurar um bom transporte coletivo em superfície. A alegada modernidade, subsidiada pelos lobbies da indústria automotiva e do petróleo, foram "argumentos” avassaladores. Deu no que deu: a Cidade arca hoje com inconvenientes que custam à sociedade mais do que o seu orçamento anual.
Mas a discussão continua, em favor de um ambientalismo consistente e sustentável, contando hoje com muito mais gente esclarecida e competente. No dia 27 de setembro passado o Estadão publicou um excelente artigo do jornalista Washington Novaes chamando a atenção para: "Não é só a mobilidade – que faremos com a poluição?". Não bastasse a reconhecida competência do jornalista, especialmente nas questões ambientais, ele apoiou o seu escrito em pronunciamentos dos não menos competentes professores Paulo Saldiva e Evangelina A. Vormittag, assistidos ainda, em seminário promovido pela Câmara Municipal de São Paulo, por mais cinco pesquisadores.
É difícil citar Novaes, sem copiar-lhe os textos, dada a densidade do que escreve. Mas eu me arrisco a fazê-lo, iniciando por uma transcrição:
"Se houvesse uma redução de 10% nos poluentes na capital entre 2.000 e 2.020, poderiam ser evitados nada menos que 114 mil mortes, 118 mil visitas de crianças e jovens a consultórios, 103 mil a prontos-socorros (por causa de doenças respiratórias), 817 mil ataques de asma, 50 mil de bronquite aguda e crônica, além da perda de atividades em 7 milhões de dias e 2,5 milhões de ausências ao trabalho. Em apenas um ano (2011) a poluição da atmosfera contribuiu para 17,4 mil mortes no Estado”.
Além das informações anteriores, Novaes ainda acrescenta que "o tráfego e a poluição explicam 15% dos casos de enfarte na cidade de São Paulo” e o aumento pode ser um fator de risco para o desenvolvimento de câncer de pulmão.
Ao mesmo tempo, o articulista recorda que:
"Programas de controle da poluição do ar por automóveis, implantados a partir da década de 1990, tenham levado a uma redução de 95%, assim como a 85% na de caminhões. Até os cinco primeiros anos desta década, a diminuição de 40% na concentração de poluentes evitou 50 mil mortes e gastos de R$ 4,5 bilhões com saúde – além da redução no consumo de combustíveis e na emissão de poluentes”.
Ao lado da informação técnica, verifica-se que ações governamentais bem conduzidas podem ter efeito de grande importância na solução dos problemas da sociedade. Por tudo isso, o artigo de Novaes deve ser lido na íntegra e divulgado amplamente para que todos concorram na grande tarefa da sustentabilidade das políticas públicas.
Outra matéria jornalística, que contribui para a discussão do tema, está na pág. 85, da revista Carta Capital, de 02/10/13, com o titulo:"Fumaça = ADM”. Nesse título, o dr. Riad Younes já caracteriza a poluição atmosférica como Arma de Destruição em Massa. Citando estudos que "mostram que a poluição cotidiana em nossas cidades mata tanto quanto as armas de destruição em massa”, o autor propõe que se classifique a poluição como "arma química de destruição ema massa”.
Em abono de sua tese, o dr. Riad menciona as pesquisas do dr. AC Pope, da Universidade de Brigham Young, em Utah, EUA, em parceria com outras universidades e a Sociedade Americana de Câncer, que concluíram que "cada aumento de 10 microgramas por m3 na concentração de partículas finas no ar das cidades elevou a mortalidade geral, por câncer de pulmão ou por doenças cardiovasculares, entre 4% e 8%”.
Artigos como estes citados nos convencem de que o problema já é suficientemente conhecido, podendo ser resolvido através de políticas publicas bem elaboradas. Por outro lado, também já se conhecem em detalhe os inconvenientes causados à atmosfera pela poluição, bem assim suas consequências no Planeta, como o aquecimento global, entre outras, assunto de que tratarei em artigo próximo.
Por  que, então, o mundo não se une num esforço universal para cortar pela raiz os hábitos de vida que estão levando a humanidade a uma possível catástrofe? Arrisco-me a dizer que a prevalência das diretrizes do mercado sobre as políticas de sustentabilidade responde em grande parte pela inação pública e social.
O artigo de Evaristo E. Miranda, publicado no Estadão de 30/09/13 sob o sugestivo titulo de "Descréditos de Carbono, é rico de considerações que nos levam a conclusões importantes. Diga-se, de passagem, que a matéria citada é da melhor qualidade e deveria ser difundida amplamente.
Diz o dr. Evaristo que o planeta procurava um substituto para o petróleo e o encontrou: o gás de xisto e o carvão mineral. A abundância do gás fez reduzir-se o preço do combustível, reduzindo-se a ameaça do alto custo do petróleo e até mesmo das fontes renováveis de energia, como a eólica e a solar.
É, portanto, uma questão de mercado, que não leva em conta o problema ambiental. Isso se nota em dados como os publicados pelo Journal of Environmental Studies and Sciences, que, preocupados com os custos diretos, comparam os seguintes preços de energia:
Energia do carvão
US$ 0,030 por kW.h
Novas usinas a gás
US$ 0,062 por kW.h
Energia eólica
US$ 0,08   por kW.h
Solar fotovoltaica
US$ 0,133 por kW.h
Embora os dados oferecidos por Keith Johnson, em seu artigo "EUA debatem mitos sobre a energia renovável” (Valor Econômico, 30/09/13) se concentrem em custos diretos da exploração, não deixam de ponderar que os custos das energias alternativas não poluentes tendem a decrescer e, na comparação com os poluidores, é preciso ter em conta os custos indiretos, ambientais. Mas nem longe abre uma discussão acerca dos males da poluição ambiental.
Estamos diante de nova luta: a economia de mercado busca substituir o petróleo por outra fonte fóssil, especialmente o gás de xisto, hoje mais barata. As energias renováveis – entre elas o etanol, em que o Brasil jogou muitas das suas expectativas – ficarão à espera da elevação dos custos das outras fontes, que provirão de seu progressivo esgotamento.
A utilização das energias limpas, nessa linha de ação, dependerá exclusivamente da sua competitividade em termos financeiros. As suas externalidades positivas, como a redução da poluição e demais inconvenientes, não entram na equação.
Novamente, então, o transporte eletrificado será visto como um estorvo. E um estorvo "caro”, que já fez abolir sistemas de bondes e de trólebus em todo o mundo. É a economia de mercado falando mais alto do que a qualidade de vida e a sustentabilidade.

Oxalá os corredores de transporte tipo BRT, que a Prefeitura de São Paulo está anunciando,baseiem-se em projetos limpos.

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